CAPITULO
VIII
A QUEDA DO
APELIDO ANABATISTA
E O
SURGIMENTO DO APELIDO BATISTA
Na metade do século XVI, e no princípio do século XVII, há uma
súbita queda do apelido "anabatista" e o aparecimento rápido do
apelido "batista" em toda a Europa. Muitos procuram ligar a fundação
das igrejas batistas na pessoa de John Smith (morto em 1612). Grandes
historiadores como Orchard e Christian já fizeram o favor de desmentir essa teoria.
Qualquer estudante da história das religiões, se agir com sinceridade,
descobrirá que os batistas são o fim dos anabatistas. Os batistas são a junção
de diversos grupos anabatistas em torno desse nome com a queda do prefixo
"ana". E isso não aconteceu de repente ou de uma só vez. Foram
necessário quase um século para que a junção dos anabatistas ao nome batista
fosse possível. E só se tornou possível devido ao laborioso trabalho de resgate
de pastores itinerantes que, levantados por Deus, uniram os diversos grupos ao
nome batista e também, ao nome "menonita".
POR QUE O
APELIDO ANABATISTA CAIU?
Vimos que no inicio do século XVI, muitos anabatistas, iludidos
com o aparecimento de alguns lideres da reforma, saíram de seus esconderijos e
foram habitar nas cidades e povoações onde a reforma explodia. Não demorou
muito e toda a Europa Central foi minada com a chegada desses cristãos. No sul
da Alemanha, na Boêmia, na Suíça, na França, na Hungria e nos países baixos, os
anabatistas estavam fortemente organizados. Animados com a chance de novamente
poderem pregar publicamente - isso depois de 1200 anos - deixaram os Pirineus e
os Alpes e marcharam rumo ao norte da Europa.
O sucesso foi imediato. As conversões multiplicavam-se. A cidade
de Estraburgo, na França, chegou a ter mais de dez por cento de sua população
anabatista. Só na Morávia, o pastor Jacob Hutter, organizou mais de oitenta
igrejas em menos de dez anos. Hutter foi morto em 1526 pregando o evangelho. O
pastor Hans Huth, encadernador itinerante, estendeu o evangelho por numerosos
países da Europa. Abriu centenas de igrejas no sul da Alemanha e na Austria. Em
1527 ele foi preso em Ausburgo, interrogado e submetido a tortura; morreu no
mesmo ano, devido a queimaduras publicamente sujeitado. O pastor Hubmaier teve
grande participação dos trabalhos na Morávia, onde encontrou auditório e
leitores para seus panfletos. Em 1528 ele foi queimado na cidade de Viena. Sua
esposa foi lançada ao Danúbio com uma grande pedra no pescoço.
Cálculos menores indicam que só nos Países Baixos morreram mais
de 30.000 anabatistas em menos de cinco anos de perseguição. A perseguição foi
brutal e desumana. Além dos casos mencionados acima temos um muito famoso: O
martírio de Miguel Satler. Este era um pastor batista. Sendo um homem de muita
sabedoria, coube a ele, em 1527, redigir a Confissão de Schleitheim, o credo
anabatista. Foi o documento mais largamente divulgado entre os anabatistas, o
qual, como já mencionamos, era um precioso resume dos artigos de fé das igrejas
anabatistas e posteriormente batistas. O ato lhe custou o martírio. No livro
Breve História dos Batistas, pg 59, temos um comentário extraído de sua
sentença de morte:
"Miguel Satler deverá ser entregue ao carrasco. Este o
levará até a praça e aí primeiro lhe cortará a língua. Depois o amarrará a uma
carroça e com tenazes incandescentes tirará, por duas vezes, pedaços de seus
corpo. Em seguida, a caminho do lugar da execução fará isso cinco vezes mais e
depois queimará seu corpo até o pó como um arqui-herege"
Assim ele morreu. Quando já na fogueira, as chamas queimaram as
cordas que lhe prendiam as mãos, e ele levantou os dedos indicadores. Era o
sinal combinado com os irmãos anabatistas para indicar que os sofrimentos eram
suportáveis.
Os anabatistas cresceram tanto no século XVI que despertou o
ódio dos católicos e protestantes. A ilusão de que a reforma os ajudaria
transformou-se numa grande desilusão. Os protestantes do norte da Europa
fecharam-lhe as portas e iniciaram um período de perseguição intimidadora, que
visava apenas fazerem parar de crescer. Não adiantou. Continuaram a crescer.
Foi Lutero, em 1525, que desencadeou uma perseguição em massa. Essa perseguição
atravessou as fronteriras da Alemanha e o apelido "anabatista"
tornou-se um sinônimo de morte. O historiador Dickens relata sobre esse fato
escrevendo um comentário de Bullinger, um escritor luterano contemporâneo de
Lutero: "Por toda a parte, tanto a católicos como a protestantes, estes
sangrentos sucessos - referindo-se a chacina causada por Lutero - serviram de
aviso. Deus abriu os olhos dos dirigentes, e de futuro ninguém poderá acreditar
num anabatista, mesmo nos que se dizem inocentes."
Bullinger deixa claro o que Lutero fez aos anabatistas no dia 25
de Junho de 1535 na cidade de Munster ao chamar o ato de "sangrentos
sucessos". Sua ironia em comentar o caso mostra que o reformador tinha
pleno apoio de seus seguidores. Além do que a opinião de Bullinger foi certeira
no que se refere ao futuro difícil que os anabatistas teriam pela frente. Após
a chacina, até o ano de 1566, tanto católicos como protestantes buscaram
tenazmente a destruição das igrejas anabatistas.
Assustados os anabatistas começaram a deixar de usar este
apelido. Sabiam que a simples identificação como anabatista bastava-lhe para
ser morto. A partir de 1533, tanto católicos como protestantes resolveram que
iriam exterminar o anabatismo. Por isso eles se refugiaram pelos Países Baixos
e já não podiam pregar publicamente. Na busca pela sobrevivência espalharam-se
como uma denominação organizada. Alguns pastores, tentando evitar o martírio,
mudavam-se de lugar e de nome também. Os pastores mais famosos eram os mais
procurados. Foi o caso de João de Leida, que fugindo de Munster, instalou-se em
Basiléia. Lá, gozando de uma certa liberdade, trocou seu nome para David Joris,
e pregava na clandestinidade. Considerado o mais famigerado de todos os
anabatistas, depois de morto, seu corpo é retirado do túmulo e queimado junto
com seu livro "Wonderboek".
O que aconteceu a João de Leida foi a realidade de milhares de
anabatistas do mesmo período. Mas tinha um problema. Mudavam de lugar e de
nome, porém, como mudar de Senhor? Como não rebatizar os católicos e
protestantes que eram convertidos na clandestinidade? Por onde iam acabavam
sendo descobertos pelo fato de batizarem por imersão os seus membros. Foi assim
que seus inimigos começaram a chamá-los de "batizadores" ou
"batistas".
Earle Cairns, em seu livro O Cristianismo Através dos Séculos,
página 248, afirma que: "os anabatistas são os ancestrais diretos das
igrejas menonitas e batistas hoje espalhadas pelo mundo."
O RESGATE
DOS ANABATISTAS
Com a dispersão dos anabatistas muitos acabaram em lugares
longínquos. Foi preciso haver um "resgate" dos membros dispersos.
Muitos anabatistas foram encontrados e resgatados às fileiras da fé pela ação
itinerante de pastores que viajavam por toda a Europa em busca das ovelhas
dispersas. Veja o relato de Dickens:
"Sabe-se que durante estes anos (de 1536 a 1561) Menon
Simon viaja infatigavelmente através da Alemanha e dos Países Baixos,
confirmando e estendendo os grupos que haviam conseguido escapar à
perseguição... O pintor de Vitrais David Joris (morto em 1556) tornou-se também
um outro organizador itinerante. Foi finalmente obrigado a fugir para Basiléia,
onde, escondido durante largos anos, conseguiu evitar a fogueira."
Assim fica claro que após a perseguição desencadeada de 1533 os
anabatistas que se dispersaram foram reagrupados por pastores itinerantes. Os
resgatados por Menon Simon - nem todos - acabaram sendo conhecidos por
menonitas, e existem como denominação até hoje. Os que foram resgatados por
David Joris, e muitos outros pastores anabatistas, ficaram sendo conhecidos
como "batistas".
A ÉPOCA DA
MUDANÇA OFICIAL DO APELIDO ANABATISTA PARA BATISTA
A época exata da mudança do apelido anabatista para batista está
entre os anos de 1533 até o ano de 1638. Temos relatos de que o nome batista
era usado já no século XVI, e também que o apelido anabatista ainda foi usado
no século XVII. Para se ter uma idéia clara sobre esse assunto basta o
estudante lembrar que David Joris, que morreu em 1556, agrupava os anabatistas
em torno do nome "batista". Mas por outro lado, a primeira Igreja
Batista dos Estados Unidos, em Rhode Island, antes de ser chamada de batista
era formada por crentes "anabatistas", isso no ano de 1638.
Relatos oficiais dos batistas norte-americanos nos informa que:
Nos Estados Unidos, na província de Rhode Island, foram fundadas as duas
primeiras igrejas batistas da América. Uma em 1638 e a outra em 1639. A
primeira em Newport e a segunda em Providence. A primeira, quando foi fundada
em 1638 pelo pastor John Clark, foi conhecida como "Igreja
Anabatista". Já em 1648, talvez pela tendência que todas as igrejas
anabatistas tomavam, eles já tinham mudado o nome para "Igreja
Batista". A segunda igreja, de Providence, é na verdade filha da primeira.
Roger Williams, um de seus memoráveis fundadores, foi batizado por John Clark
em 1638. Assim, a autoridade da ministração do batismo dos batistas americanos
foi concedida diretamente de autênticos pastores anabatistas e que depois foram
conhecidos como batistas.
Também na Inglaterra, a primeira igreja tida oficialmente como
"batista", foi formada por membros que receberam o batismo dos
anabatistas resgatados por Menon Simons. O nome do primeiro pastor desta igreja
é Tomaz Hellys, convertido em 1612.
Portanto, a partir de 1612 na Inglaterra e de 1638 nos Estados
Unidos, já estava definitivamente caído o prefixo "ana" dos
anabatistas. Ficou somente a raiz da palavra, "batistas", apelido
este que o precursor de Jesus já levava por seu costume de batizar crentes
arrependidos de seus pecados.
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