CAPÍTULO VI
IDENTIFICANDO
OS ANABATISTAS DO SÉCULO XII A XV
Os anabatistas dos séculos XII ao XV são a continuação ou os
descendentes diretos dos anabatistas primitivos. A única coisa que vai mudar é
o sobrenome do apelido. Vimos que na primeira geração de anabatistas havia
quatro grandes correntes, que ia desde o Oriente Médio até a Europa. A partir
do século XII, a mais forte destas correntes (os paulicianos) fundiu sua identidade
com os irmãos europeus que serão estudados neste capítulo.
Dois grandes grupos de anabatistas apareceram neste período.
Esse número pode ser bem maior, mas me falta conhecimento para integrá-los aos
demais. Não é nossa idéia trabalhar com hipóteses. Trabalhamos com declarações
e documentos de estudiosos no assunto de história das igrejas. Por isso
consideraremos apenas dois grupos como autênticos anabatistas. São eles: Os
albingenses e os Valdenses. A história de amor pela palavra de Deus, e a
perseguição que sofreram decorrente deste amor, é uma das histórias mais lindas
e tristes que já li.
OS
ANABATISTAS CONHECIDOS COMO ALBIGENSES
Após os quatro grupos primitivos de anabatistas os albigenses é
o primeiro a se destacar como seus descendentes. Já se notou que os
montanistas, donatistas e novacianos, após a investida de Roma e Constantinopla
sobre eles, foram obrigados a se refugiar na região dos Pirineus, sul da
Franca. Também os paulicianos a partir do século XI se fixaram nestes lugares.
Foi exatamente assim que Deus guardou sua igreja pura e viva, para descobri-la
novamente ao mundo e pregar as boas novas. Os velhos nomes morreram, mas a fé
permaneceu a mesma. A doutrina também não mudou. Também não mudou o costume de
rebatizar os católicos, e por isso todos os dois grupos eram identificados como
seus antecessores, ou seja, "anabatistas".
A Origem dos Albigenses
Alguns historiadores traçam a origem dos albigenses como tendo
provindo dos paulicianos (Enc. Brit. I pg 45), enquanto outros afirmam que eles
se achavam no sul da França desde os primeiros dias do cristianismo. Este
apelido não provém do nome de um pastor famoso, como por exemplo os novacianos.
É um apelido proveniente do lugar onde os anabatistas se encontravam. Albi era
uma cidade no distrito de albigeois, no sul da França.
Após a perseguição desencadeada por Roma e Constantinopla sobre
os montanistas, novacianos e donatistas, estes três grupos, sem exceção,
ficaram impedidos de pregar nas cidades do ocidente e do oriente onde
prevalecia o poder papal. A prática de rabatizar os católicos era punida com a
morte. Então, num gesto de conseguir a sobrevivência da fé e da ordem
apostólica, estes grupos procuraram esconder-se nos Alpes e nos Pirineus. Ao
chegarem nestes lugares perderam o antigo apelido e foram conhecidos por outros
apelidos: ALBIGENSES - pelo lugar onde se refugiaram; CÁTAROS - Devido a pureza
de vida que levavam; HOMENS BONS - Pela inegável integridade desses crentes; e
ANABATISTAS - por rebatizaram os que vinham do catolicismo romano ou ortodoxo.
Não existia diferença entre as doutrinas dos recém-chegados a
esse refugio - como foi o caso dos paulicianos - e os anabatistas já instalados
ali há quase um milênio - a saber, os montanistas, novacianos e donatistas.
Mesmo vindos de cantos totalmente diferentes e de diversos lugares do mundo
antigo, ao chegarem nos vales dessas montanhas, uniam-se facilmente uns com os
outros. O crescimento dos anabatistas neste lugar fez o dr. Allix calcular o
seu número em três milhões e duzentos mil pessoas só nos Pirineus. (O batismo
Estranho e os Batistas, pg 63). É maravilhoso saber como Deus guardou os
anabatistas por tantos séculos e depois ajuntou-os num mesmo lugar. É
maravilhoso saber que a podridão do catolicismo não conseguiu penetrar nessas
igrejas de Jesus Cristo por todos estes séculos.
Perseguição contra os albigenses
Qualquer pessoa pode por si mesma fazer um estudo minucioso
sobre as atrocidades cometidas contra os albigenses. O que o catolicismo fez
por mais de um século contra esse grupo de anabatistas pode ser lido em
qualquer biblioteca de uma simples escola pública. Basta pegar uma enciclopédia
e abrir na página de Inocencio III. Este papa católico foi um dos muitos que
mataram friamente anabatistas por mais de mil e trezentos anos. Só que as
atrocidades deste papa foram todas registradas e não podem ser escondidas da
sociedade. Para a igreja católica ele é um santo. Para mim o mais usado por
Satanás de seu tempo.
O Papa Inocencio III (1198-1216) desencadeou contra os
anabatistas de albi o que foi chamada de "a quarta cruzada". A
chacina, iniciada em fins do século XII, iria se prolongar até meados do século
XIII. Centenas de milhares de albigenses - também chamados de cátaros e bons
homens, foram cruelmente assassinados pelo mandato papal. Houve em 1167 na
cidade de Toulouse o chamado "concílio albigense". Assunto: Tratar
simplesmente dos hereges anabatistas que lá viviam. O resultado desse concílio
foi a quarta cruzada posta em vigor pelo papa Inocencio III. Em 22 de Julho de
1209, quase toda a população de Béziers foi massacrada. O papa Inocencio e seus
sucessores, em nome de Deus, matava anabatistas como se mata porcos. Alguns
albigenses que conseguiram se refugiar em Montségur (foram estes os últimos
albigenses anabatistas a assim serem chamados), conseguiram sobreviver até o
ano de 1244. O escritor Nicolas Poulain assim descreveu o seu fim:
` "A 16 de Marco de 1244, os sitiadores prepararam uma
enorme fogueira no sopé do rochedo de Montségur. Então, os 200 sobreviventes
saíram do refúgio e desceram em lenta procissão até seus carrascos. Os sãos
sustinham os enfermos; de mãos dadas, entoavam hinos religiosos. Entre eles,
havia uma mãe com sua filha doente... impassíveis, todos entraram nas chamas...
o local onde foi erguida a fogueira ainda é conhecido como o "campo dos
queimados"; ali se erigiu uma esta funerária onde foi gravada a seguinte
inscrição: "EM MEMÓRIA DOS CÁTAROS, MÁRTIRES DO PURO AMOR CRISTÃO."
E ainda há quem defenda um homem como Inocencio III. E ainda há
quem ache a igreja católica ser a igreja que Jesus deixou. Não, não é. Deus não
tem assassinos como pastores. Sua igreja não é uma igreja assassina, pois,
"a porta do inferno não prevalecerá contra minha igreja." Se leitor
duvida do que aqui está escrito procure saber por si mesmo a verdade. Mas
busque a verdade.
OS
ANABATISTAS CONHECIDOS COMO VALDENSES
A perseguição que o papado moveu contra os albigenses durante
várias décadas fez os anabatistas a se deslocarem para muitos lugares. O nome
albigense era sinônimo de morte. Surgiu então um outro apelido para designar os
anabatistas deste tenebroso período. Foram chamados de Valdenses.
A Origem dos Valdenses
Os livros relatam que os valdenses se originaram de um rico
comerciante de Lion em ll76. Seu nome era Pedro de Valdo, daí valdenses. Mas a
verdade é que esse grupo é uma continuação dos albigenses. Vendo os anabatistas
albigenses que a perseguição no sul da França não ia ter fim - como não teve -
fugiram para outras localidades. Em suas fugas iam evangelizando e rumando sempre
para o norte da Europa. Foi onde Pedro de Valdo se converteu, e por ser famoso,
os inimigos logo apelidaram os antigos albigenses de Valdenses.
Significativo é o depoimento de Raisero Sachoni. Ele foi por
dezessete anos um dos mais ativos pregadores dos "Cátaros" ou
"Valdenses". Mais tarde uniu-se à ordem dominicana apostatando da fé.
Tornou-se um acérrimo inimigo dos Valdenses, e por isso o papa fe-lo inquisitor
da Lombardia. Por muitos anos, até sua morte, acusou e mandou matar seus
ex-irmãos anabatistas. Foi um judas. Sua opinião sobre a origem dos valdenses é
como se segue:
"Entre todas as seitas não há mais perniciosa à igreja
(católica é claro) do que os valdenses. Por três razões: Primeira, porque é a
mais antiga, pois alguns dizem que data do tempo de Silvestre, 325 A.D.
(Silvestre foi o papa que junto com Constantino condenou os donatistas,
montanistas e novacianos), outros ao tempo dos apóstolos. Segunda, é a mais
largamente espalhada, porque dificilmente haverá um país onde não existam.
Terceira, porque, se outras seitas horrorizam aos que a ouvem, os valdenses,
pelo contrário, possuem uma grande aparência de piedade. Como matéria de fato,
eles levam vidas irrepreensíveis perante os homens e no que respeita a sua fé,
aos artigos do seu credo, são ortodoxos. Sua única falta é que blasfemam contra
a igreja e o seu credo".
O testemunho desse apóstata é muito importante. Não é fácil para
um legado católico dizer que "datam do tempo de Silvestre ou dos
apóstolos". Outro escritor, dessa vez um francês, Michelet, diz na
Historie de France, II, pg 402, Paris 1833: "Os valdenses criam numa
continuidade secreta através da Idade Média, igual a da Igreja Católica". E Neander adiciona na History of the
Christian, pg 605, Vol. IV, 1859: "Não é sem fundamento a afirmação dos valdenses
deste período (1100 em diante), a respeito da antigüidade de sua seita, e que
tinha havido, desde o tempo da secularização da igreja, a mesma oposição (a
igreja Romana) que eles sustentavam".
Os historiadores que se tem especializado na história dos
valdenses sustentam a idéia de que as doutrinas dos valdenses não se originaram
com Pedro Valdo. Diz Faber, The Waldenses and Albigenses:
"A evidencia que acabo de produzir, prova, não somente que
os valdenses e albigenses existiram antes de Pedro de Lião; mas também, que no
tempo do aparecimento dele nos fins do século doze, havia duas comunhões de
grande antigüidade (O autor refere-se aos albingenses e valdenses ao dizer que
existias duas comunhões). Segue-se, portanto, que mesmo nos séculos doze e
treze, as igrejas valdenses eram tão antigas, que a sua origem remota foi
atribuída, mesmo pelos seus inimigos inquisitoriais, ao tempo além da memória
do homem. Os romanistas mais bem informados do período, não ousaram fixar a
data da sua origem. Eram incapazes de fixar a data exata dessas veneráveis
igrejas. Tudo que se sabe é que eles tinham florescido ao longo do tempo, e que
eram muito mais antigos do que qualquer seita moderna".
Portanto, a se alguém quer saber a origem dos valdenses saiba
que, apesar de receberem esse apelido somente a partir de 1100, já eram
conhecidos como albigenses, paulicianos, donatistas, novacianos e montanistas.
Tinham de diferente apenas o apelido, mas eram todos de uma mesma comunhão.
Também todos, sem exceção, foram chamados de "anabatistas". O fato de
aparecer paralelamente no mesmo período albigenses e valdenses, não quer dizer
que os valdenses não seja uma continuação dos albigenses. Quer dizer que
durante um período de mais ou menos meia década, enquanto o apelido albigense
caía em desuso, crescia o nome valdense. É o que chamo de período de transição.
O estudante notará que a mesma coisa aconteceu no século XVI. Neste período,
enquanto caía o apelido anabatista, surgia o apelido batista.
A doutrina dos valdenses
Suas doutrinas eram idênticas a dos primitivos anabatistas. Há
dois documentos datados de cerca do ano 1260 A.D. escritos por católicos que
descrevem os valdenses: Um deles diz: "os valdenses vestiam com relativa
simplicidade, comiam e bebiam moderadamente, sempre laboriosos estudiosos,
havendo entre eles muitos homens e mulheres que sabiam de cor todo o novo
testamento".
O outro documento é o tratado de Davi de Augsburgo, escrito
sobre os "pobres de Lião" ou valdenses, e impregnado de ódio e
antipatia. Este documento diz que os valdenses proclamavam-se "discípulos
de Cristo e sucessores dos apóstolos" e quando eram excomungados,
regozijavam-se com o fato de terem de sofrer perseguição como outrora os
apóstolos, "nas mãos dos escribas e fariseus". O documento informa
que eles rejeitavam os milagres eclesiásticos e os festivais, ordens, bênçãos,
etc., dizendo que essas coisas foram introduzidas pelo clero cobiçoso;
batizavam os que abraçavam seus princípios, dizendo alguns deles que o batismo
de crianças não vale nada, pois elas são incapazes de crer. Não criam que o
sangue e o corpo de Cristo estão na eucaristia, limitando-se a abençoar o
elemento como um símbolo. Celebravam a ceia, recitando palavras do evangelho;
negavam o purgatório, o concubinato, o sacerdotalismo, o legalismo, etc.
A Perseguição dos Valdenses
Assim como os albigenses os valdenses foram tenazmente
perseguidos pela Igreja Católica. A Inquisição matou, queimou, afogou, esfolou,
torturou e fez muito mais para destruir os valdenses. Só para o estudante ter
uma idéia, o Papa João XXII (1316-1334), tendo um rendimento farto e regular
dos impostos criados por ele mesmo, gastava 63% do tesouro papal para financiar
a guerra contra os anabatistas e os muçulmanos. (O Papado na Idade Média, pg
140 e 143). O papado obrigou o povo a pagar impostos com o intuito de financiar
guerras visando o extermínio dos anabatistas. Em todos os países era passada a
chamada "rota romana" com os ad doc - que significa "a
isto" - pressionando e atormentando o povo a pagar o tributo para o papa.
No final do século XV os valdenses ainda estavam de pé. Suas
forças estavam nos vales dos Alpes. Tinham uma escola prática em Milão e de
ramificações em zonas distantes como a Calária e a Apúlia. Possuidores de um
noviciado e de seminários independentes, os valdenses punham em campo uma
grande quantidade de missionários itinerantes, os quais, conheciam de cor
longas passagens dos evangelhos e das epístolas.
Infelizmente muitos se ligaram com os hussitas na Boêmia e com
os Lolardos na Inglaterra. Isso degradou em muito a pureza de muitas igrejas
valdenses, pois estas igrejas, assim como as protestantes, pregavam uma fé que
podia-se pegar em armas para defender direitos. No século XVI a euforia da
reforma também varreu uma grande parte dos valdenses. Acredito que isso
destruiu o grupo como denominação. Alguns se aliaram com os luteranos na
Alemanha, outros a Zuinglio na Suiça, e uma grande parcela com Calvino. Os
fiéis, que não se misturaram, continuaram anabatistas puros. Até hoje existe
algumas igrejas com o nome denominacional "valdense".
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